quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Sal das feridas

Vivo na tua retina. Presa no momento antes do orgasmo.
Vivo suspensa na tua respiração. Sempre que te recordo,
a minha imagem solta-se da tua memória
para o agreste do teu presente. Quando o sentimento
me agride a garganta, ouves o teu nome e as palavras
que guardei dentro de ti. Vivo na tua desesperança.
No intenso da tua negação. Sempre que te aprisiono
é o meu sorriso que tolda a tua linha de pensamento.
O teu olho desvia-se da rota que lhe desenhaste
para se quedar na perfeição da nossa ligação.
Em todos os momentos que juras jamais saber
os meus pontos finais e as reticências.
Em cada segundo que lhe seguras as ancas
é o meu gemido que ouves.
Vivo no vislumbre de um raio de sol, mesmo quando
garantes a liberdade do teu coração, mesmo quando
prometes as promessas com que agrilhoas a vontade.
E se alivias a pressão com que finges sonhar
são os meus lábios no teu sexo, é a minha língua
na tua barriga, é a minha mão na tua pele.
Vivo no escuro da tua alma.
A minha mente seduz a tua indecisão, a angústia
que te embala as vontades, o pulso com que
resolves as aparências. O perigo do meu ventre.
O sabor da minha inocência perdida.
O trago amargo do sangue.
Vivo no sal das tuas feridas.

domingo, 14 de novembro de 2010

Esqueces-me

Existem momentos que mesmo o amor não nos chega. E embora o meu coração não queira assimilar essa verdade, a espessura dos seus vértices rasga-me a garganta.
Existe um dia em que partes. Sem olhar para trás. Esquecem a tua ausência. E tu, aprendes a esquecer que um dia amaste.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

O grito do silêncio (revisitado)

A pedido de um leitor recoloco aqui um poema que podem encontrar originalmente no antigo blog datado de 2006 (já vão uns aninhos valentes lol)
E demorei algum tempo a encontrá-lo.. Mesmo sabendo que as palavras eram claramente minhas.

Aqui fica :)

O grito irrompe-me o silêncio.
Hoje não grito sem voz.
Hoje grito até partir os espelhos.
Todos os espelhos.
Que reflectem a minha pele nua e pálida.
Sou frágil, penso.
Estou nua, desprotegida, cansada.
Estou cansada de lutar,
de rasgar o papel das paredes,
as bonecas de papelão.
Parem o carrossel...!

O grito irrompe-me a garganta.
Hoje grito para todos ouvirem.
Os que estão longe.
E os que estão perto.
Hoje não te poupo aos gritos
que me semeias nas mãos.
Hoje lanço-te,
farpas afiadas e agudas.
Verdadeiras.
Porque a verdade rasga.
A verdade dói.
A verdade, a puta da verdade...
Grita!
Ela rompe os meus limites,
os teus limites,
os nossos limites.
Hoje não somos nós.
Hoje sou só eu.
Eu... Nua. Sozinha.
Sem máscaras.
Hoje rasgo-te sem dó
porque a minha vida e a minha sanidade
estão em perigo.
Hoje não deixo mais que me
amarres os pulsos
ao teu sorriso amargo.
Hoje não permito, sequer,
que insinues o que não
pode
ser
insinuado.
Hoje odeio-te.

Grito...
Grito neste silêncio de mim,
tão meu,
tão inalterável pelo tempo
e pelas vivências de vida.
Há em mim um
mar revolto
que rasga o meu peito.
Há em mim
um estertor de morte.


Tomo II

(sussurrado)
Os passos dele
perturbam o silêncio
do meu espaço.
Invadem-me os sentidos
com uma urgência insuportável.
Os passos dele
apagam de mim
os rostos,
os nomes,
as vestes,
o que conheço.
O fim de mim em mim.
Os passos dele...
(grito)
OS PASSOS DELE
ARRASTAM-ME
PELO ESPAÇO
NÃO MEU...
NÃO MEU....
NÃO MEU...
APAGUEM DE MIM ESTE GRITO
APAGUEM DE MIM
ESTES PASSOS
ESTES... LÁBIOS,
ESTAS MÃOS NO MEU PESCOÇO
esta...asfixia...

Tomo III

Escrevo na parede
da loucura:
"Onde estás quando preciso de ti?
Estás infinitamente longe...
Quando...
preciso de ti
".

domingo, 24 de outubro de 2010

Cordão umbilical

No início dos tempos, no fio que conduz a eternidade,
o teu rosto era espelho do meu.
Reflexo perfeito da minha ternura,
contorno da infinitude do meu ser.
Na primeira palavra que seduz
o olhar, na luz que emana do âmago,
os teus olhos eram os meus olhos
e o teu sorriso era desenhado com os meus lábios.
Tu eras igual a mim. Os mesmos sonhos, os anseios
que nos curvavam, a intensidade dos desejos.
E nascemos neste mundo ligados,
a tua dor a minha dor, a tua mão o meu percurso.
Um dia amanheceu mais tarde e tiveste medo de ser tu.
Os traços que te definiammeu esbateram-se,
e as vozes que assombravam o teu destino ergueram-se
imbatíveis. Aprendeste a não ser tu, a enganar e a ser fraco.
Aos poucos adquiriste outras fotografias, outras mãos,
outros sorrisos pálidos, rostos falsos,
matéria terrena com que cobriste as infantilidades
e a ingenuidade. Tu deixaste de ser eu. E eu vi-te partir.
Voltavas, inevitavelmente, com as marés violentas da necessidade.
Afinal, dizias-me tu, eras ou não o coração do meu peito?
O pulsar do meu sangue. Eras ou não as cores dos meus sonhos?
Afogavas as feridas no bálsamo da minha pele,
reaprendias os caminhos da minha alma.
Era tão fácil, tão intuitivo, tão amor-paixão-cadência.
E eu desenhava magia na curva do teu braço.
Apagava de ti os vestígios de febre e da doença de não
seres tu. Perdeste-te assim, nas viagens que fazias
ausente da minha voz e do olhar vigilante.
Perdeste-te de mim, tornaste-te parte de outros,
assumiste máscaras, corrompeste os sonhos, a ternura,
o amor. Perdeste-te de ti. És incompleto.
Guardo-te ainda, a parte de ti que é tão minha que jamais poderá
ser de alguém. A parte de ti que não é tua para venderes,
para leiloares à facilidade de quereres abarcar o nojo
que é este mundo. Guardar-te-ei para sempre.
Escondido de ti próprio. Esse pedaço que rodeia o cordão
umbilical que nos une. Deixarei que sejas incompleto.
Deixarei que te destruas, que destruas a parte de mim
que vive dentro de ti. Deixarei que semeies a mágoa,
que quebres o meu sorriso.
A única verdade que me ensinaste
é que não precisamos ser unos para avançar.
Eu avanço sozinha. Com parte de ti escondida. Adormecida.
E dessa verdade construo um caminho.


Encontramo-nos no fim dos tempos.

sábado, 2 de outubro de 2010

Os dias em que morro dentro de mim mesma

Espaços. Dentro do coração.
Espaços dentro da alma, que desenham ausências nas mãos.
Espaços em que grito e me silencio.
Abarco as injustiças, os medos, as demências, os teus sonhos
e os meus. Num abraço mudo.
Fendas. Que rompem as tapeçarias com que vesti
as paredes da casa. Da mente. Das palavras.
Eu ainda sou tão eu.
Num quarto, numa casa, num momento pálido.
E por vezes o vermelho atravessa o tempo.
Alcança-me. Poderoso. O destino é medíocre
e eu talvez possa ser feliz dentro da mediocridade
de um país falido, de uma moralidade negada, de um coração
roto por dentro. Espaços.
Espaços em que consigo ser eu.
Espaços em que o amanhã é agora.
Espaços. Rasgões. Vislumbres. Lágrimas. Risadas.
Sentimentos. Eu ainda sei sentir.

A morte tão perto e tão longe. Ainda não. Ainda não ganhei o direito de cair numa queda eterna e maternal.
A morte a espaços.
Os dias em que morro dentro de mim mesma.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

O sonho dentro do sonho

Estava dentro do teu sonho, com as tuas regras e as tuas necessidades. Precisas delas, habituaste-te e sem essas pequenas regras não acreditas na surrealidade do espaço.
Sim, dizes-me calmamente. Aceitas-me e sou-te natural, tão parte do teu sonho como todas as outras coisas. Sonhas-me

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Tela

A dor entranha-se na alma como um perfume conhecido, parte da epiderme ressequida.
Aprofunda-se, negra, na plenitude do âmago, cria raízes
tortura-me infinitamente. Fito os olhos derrotados no espelho e é a tua voz que acalma
a superfície dura da verdade. Fui um dia tão plena de sonhos e irresponsabilidades.
A solidão serena do cansaço abraça-me. Deixo-me embalar, aguardo, a respiração
quase imperceptível. Onde estás? Percorro as divisões, os dedos acariciam as paredes
e os poemas onde pincelei o teu sorriso. Falham-me as palavras e o equilíbrio.
Deixo-me cair, devagar, deito-me no chão e enrolo-me em mim mesma.
A opressão do silêncio atravessa-me como ondas de um mar revolto.
Longe, há uma criança que chora, intranquila, antevê o borbulhar
do destino imparável. As pálpebras pesam-me, existe um sono mentiroso do outro
lado da casa. Onde estás? Ouves-me, nesse teu mundo árido? Ainda sonhas?
O que é afinal, o amor? O que é o teu coração suspenso num minuto
cheio de tudo? O que são os teus braços a envolverem-me num tempo
sem tempo, onde crescem plantas debaixo dos nossos pés?
E no silêncio existe um piano mudo. As teclas movem-se poeirentas
sem qualquer som.Talvez não se movam de todo. Talvez apenas imagine
as tuas mãos a tocá-las, como se acariciassem a minha pele nua.
Onde estás? Adormeço, os cabelos a cairem-me no rosto.

Chegas suavemente e deitas-te a meu lado.
Não violas o silêncio, não me acordas, não sorris, não imaginas
momentos felizes e preenchidos. Olhas-me apenas.
Murmuras: "estou aqui".

sábado, 5 de junho de 2010

Um dia

Um dia não só vou esquecer-te como deixarei de te recordar.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Eternidade

Existe uma profundidade amena na solidão.
Daquelas que te cobrem, que escondem
as diferenças. E eu sou tão infinitamente
diferente. Revejo-me numa irmã.
Numa irmã de sangue. Numa irmã de alma.
Duas luzes num mar de escuridão.
Dois aromas suaves num imenso nada.
Sou em palavras. E gestos. Sou em olhos
e sonhos quebrados.
Existe uma intensidade gentil na ausência
de uma partilha genuína.
Traí-me, atravessei mares de mediocridade.
Febres de normalidade absurda.
Não mais!
Nunca mais este som bafiento de consolo,
nunca mais este fingimento de comodismo.
Não mais!
Nunca mais!

(quebro os espelhos, as barreiras, grito
grito um grito imenso, chamo-te,
tão infantil, tão imensa, tão chama,
grito o teu nome, abraça-me, enlaça-me,
consome-me, queima-me por dentro.
purga-me.)

Nunca mais.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Labirinto

Abarco as ausências como quem abraça o silêncio.
Construo palavras, pontes entre mim e os outros.
Explico-me, redefino-me.
Reinvento-me.
Apago-me inteira.
Quem era, deixei de ser há muito.
Aos poucos morri dentro de mim.
E renasci menos eu.
Outrora conheci medos e sentimentos
que me corroeram o coração.
Sentia toda a intensidade lavar-me,
era imensa e sabia tocar a parte mais suave
da alma.
Hoje sou apenas parte do que fui.
E nessa parte, escondo-te.
Na tua mente, existe um labirinto.
Vejo-te percorrê-lo tantas e tantas vezes.
Escondo-te.
Guardo-te, recluso no coração.
E esqueço-te. Dentro do ventrículo.
Não fales. Não sussurres. Não sonhes.

Quem era, deixei de ser há muito.
Morri dentro de mim.

domingo, 28 de março de 2010

Aqui

Deito-me numa cama de espinhos.
Aqui, nada mais importa. Deixou de existir um sol e uma lua.
As regras desapareceram.
O tempo deixou de escorrer dentro do meu coração.
A alma morre-me devagar, apodrece.
Nada faz sentido, aqui.
Posso ouvir o teu sorriso.
As mãos com que me acaricias as mágoas.
Posso ser eu, aqui.
Eu, tão torcida, tão estúpida, tão lamentável.
Eu, a consumir-me inteira.
Posso ser eu... posso... ser...
Aqui.
E as palavras, fogem-me. Como tu. Sempre tão perto.
E tão longe.
Tu, a consumir-me inteira.
Aqui, não existem morais.
Aqui, só existes tu.
Posso ser amoral.
Posso ser imoral.
Uma criança.
Uma velha.
Uma puta do caralho.
Aqui, não existem medidas. Não existem linhas de acção.
Pergunto-me como não me extingo quando sinto em espiral.
Aqui, posso sentir em espiral.
Existem tantos mundos, tantos dias e tempos infinitos, existem pessoas e espectros, existem serenidades e espantos, amor, existem tantas coisas banais.
Mas aqui não.
Aqui. Não.

terça-feira, 2 de março de 2010

Irreal

O que fazemos quando a moral, tudo o que nos ensinaram e aprendemos enquanto crianças subitamente se torna tão torpemente irreal?
Quando o corpo pede e a alma se atira num abismo de frieza e se esconde de nós?
O que fazemos quando tudo o que restam são incógnitas, becos, amarguras?
O que fazemos quando o destino surge tatuado nas ruas, nas falésias, nos pedaços de nós no mundo?
Tudo o que quero é não querer desta forma.
Ser linear e simplista. Quero acreditar e ter fé e ser banal.
Nestes dias, tudo o que quero é não ser Eu.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

A chama

Irrompo no mundo como uma chama incandescente de raiva e absolutismo.
Trago-te o comovente sussurrar da paixão.
O infalível sorriso da tristeza. O trago amargo da verdade.
Aflijo o coração de Deus com as lágrimas com que
provo as falhas da humanidade. Movo o corpo
languidamente, a pele inundada de memórias, sei como
te inflamar o sexo e o laço. Sei como te trazer até mim,
sei de cor o que dirás, o que farás, a urgência das mãos,
os lábios a rasgarem-me o isolamento.

Irrompo no seio do destino, o grito, a impaciência,
o tempo entre um suspiro e o orgasmo, a ternura de
mãos que se conhecem. O sol e lua. A flor que desperta
a Primavera. O nevão que anuncia a hibernação do ser.
Apaixonas-te por mim. Previsivelmente.

domingo, 24 de janeiro de 2010

O mundo do outro lado do espelho




Para os mais atentos já devem ter reparado que criei um novo mundo chamado

O mundo do outro lado do espelho

que se dedica aos mundos das letras e das palavras e dos livros imensos com que cubro a minha vida.
Achei que deveria mencionar. Um beijo a todos os que navegam nas minhas águas.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Sogno

A realidade sempre foi mais fria que o sonho e as cores fortes da ilusão.
As cores com que embelezei a tua pele, vesti o teu corpo.
Recriei-te em mim e em mim não podias jamais ser outro
que não o homem mistério-eternidade.
O menino pertença-abismo.
Do teu sorriso recriei um arco-íris.
Das tuas mãos recriei todo um abrigo.
O espaço onde escondi todos os meus segredos
e evidências. De ti renasci e morri todas as noites
e todos os dias, marcada pela doença e pela intensidade
das emoções. E o tempo deixou de ser tempo.
E a terra deixou de ser terra.
E o dia nasceu em que os meus olhos não te reconheceram.
Em que os segredos te brotaram das impaciências
e vieram morrer-me aos pés, secos, negligenciados.
Era eu a fitar-te. Era Ela. Ela, que é imensa e fria.
Que tem olhos de fénix. Que tem asas de demónio.
Ela, que perfurou a ilusão com que te vesti e eras tão tu,
ali, tão banal, tão humano?
O coração estilhaçou-se-me em mil pedaços, a tua voz
a afirmar que é tudo normal, que noutros mundos,
outras mulheres também geravam desinteresse.
E o meu coração estilhaçado, ela altiva a observar-te,
a rir-se, a achar tudo tão ridículo, a murmurar-me que afinal
tu sempre foste apenas mais um pássaro a esvoaçar
dentro de uma gaiola. A tua mente curvada
perante o peso imenso da sociedade. E o meu coração,
que é Dela também, estilhaçado, a sorrir-se de aborrecimento
e nojo. E a alma acordou, esticou os filamentos entorpecidos
como quem acorda de um sonho demasiadamente longo,
a alma acordou, segurou o coração estilhaçado e eu entreguei-me
a Ela. E com os seus olhos tudo o que vi foi o comum.
Não me quedarei nua a teus pés,
os olhos sem véus, não mais.
A realidade sempre foi mais fria que o sonho e as cores fortes.
Da ilusão.