sexta-feira, 14 de junho de 2013

Estilhaços

Deixo sair o ar que retive dentro dos pulmões. Um ar quente que me engasgava a alma. Não quero correr para o amanhã. Não quero sentir que esperam de mim pedaços de carne que não sei dar. Trago o coração do lado de fora do peito. Vazio de esperança e sonhos. Fustigado pelos dias em que acordar era algo normal. Fustigado pelos dias em que as palavras eram flores e pedras de arremesso. Eram mais do que meras palavras. A solidão surge-me recta. Deixo sair o ar, e com ele a navalha que trago cravada nas costelas. Deixo que as recordações, o espaço, os dias, as noites me atravessem e finalmente sinto. Sinto tudo, com um furacão que varre as escolhas. Os ombros mais leves, o coração mais vazio, mais cansado, mais sensível e cru. Mas nada, nada, mesmo nada pode preencher-me enquanto o sangue se revolta dentro das veias. E tudo o que não é, tudo o que é a antítese, tudo o que é apenas uma promessa, irrompe de mim como um grito. Porque eu não quero. Não quero ser menos do que sou, sentir que nada em mim é certo, nada é vermelho, nada é lilás. Porque eu não vou conformar-me. Estilhaço as paredes, as linhas, as amarras, os limites, estilhaço as barreiras. E tudo o que é nada, tudo o que é tudo, tudo o que é certo e errado, e vermelho e lilás, tudo o que é um fim e e um recomeço, tudo o que me oprimia o peito, tudo o que me apertava a garganta volta a ser Eu. Deixo caírem-me as lágrimas pelo rosto. E nelas renasço. Deixo que a noite se abata sobre o meu corpo. Porque eu quero voltar a ser Eu.

1 Comment:

André Gomes said...

Olá minha fada, como sempre, tinhas razão.
E assim foi.

" Eram mais do que meras palavras. E tudo o que não é, tudo o que é a antítese, tudo o que é apenas uma promessa
Porque eu não quero. Não quero ser menos do que sou, sentir que nada em mim é certo "