domingo, 26 de junho de 2011

A minha lei

Esta ainda é a minha lei e continuará a ser: Arrepender-me apenas do que não faço. E esta é a minha única linha de continuidade.
Não sou contínua. Não sou linear. Não sou um ponto final. Não sou resignação.
Não sou conformidade, não sou fácil, não sou uma recta.
Eu sou um ciclo. Eu apenas continuo de onde parei.
Quando morrer, páro. Quando não tiver voz deixo de gritar. Quando me quebrarem, quando me vergarem.
Até esse momento eu sou eu.
Com tudo o que isso tem de branco e negro. E vermelho. E lilás.
Ama-me. Odeia-me. Despreza-me. Nega-me. Acolhe-me. Aceita-me.
Antes a solidão que a escravidão do ser. Antes o grito que a aceitação banal dos que se fingem.
Vergo quando perco as forças e caio no chão. Mas levanto-me. Reergo-me. Avanço. Apenas com a força da vontade.
Ainda não me quebraram os joelhos fracos. Ainda não me rastejam pelo chão. Não enquanto tiver força para respirar. Não enquanto me restar alguma dignidade.
Tudo o que quero é a memória de quem sou e a independência pequena que o trabalho das minhas mãos me traz.
Tudo o que quero é não precisar das mãos que nunca se estendem, das palavras que não se ouvem. Tudo o que quero é jamais precisar de quem
precisa de mim.
A vida tem sido puta comigo. Mas eu sou puta com a vida.
Querem caminhar caminhem a meu lado. Nunca comigo por uma trela. Nunca comigo com os olhos comidos pelo sal que me apagou a face.
As feridas do corpo saram. As da alma ficam marcadas a lume.
Sim. Termino onde começo. Em espiral. Eterna. Porque eu sou sempre a mesma. Sempre honesta. Sempre firme. Sempre os traços que me definem o rosto.
Não vaciles, amor. Não te movas. Não dês passos em falso. Mantém-te a meu lado. E eu manter-me-ei igual a mim própria. E isso é tudo o que posso prometer.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Matéria do teu coração

Vejo-te menino, sorrir-me por entre os dias que nos
esmagaram o coração. Vejo-te os olhos e as inocências
que guardaste no espaço que é nosso.
Sento-me a teu lado e estás cansado,
as cicatrizes ardem-te no peito.
Afago-te o cabelo e sorrio-te.
E o meu sorriso é o sorriso dos dias que me conhecias
e as tuas mãos eram as minhas mãos.
A matéria do teu coração
é a matéria da minha alma. Somos duas faces da mesma moeda.
E sei que, finalmente, nos perdoámos.
Vejo-te tão nitidamente como outrora.
E no fim de todos estes anos és tu que me habitas.
Sempre tu. E o meu amor é tão infinito como sempre foi.
Curei a alma e voltei a ser eu.
Vês-me. E toda eu sou tua. Sorrio-te.
Recuperei a minha luz. Não te forço. Não te violento.
Estou aqui e sou eu. E tu és o eco da minha luz.
Percorro as tuas cicatrizes com os dedos.
Amo-te hoje como sempre. As minhas palavras, tuas.
O meu sorriso, teu. A minha alma aos teus pés.
Eu apenas sou eu quando me olhas. Eu apenas luzo quando
és tu que me observas. Não me importam os outros,
as suas mãos e as suas dádivas. Apenas tu.
Porque apenas tu me compreendes. Apenas o teu sangue
corre no mesmo sentido que o meu.
Tu que me aceitas e me respeitas e me sabes.
Tu que nunca me largaste palavras duras.
Que permitiste que te violentasse
quando tinha o coração em ferida.
Tu que sempre estiveste aqui.
Mesmo quando existiam outros braços,
outras ternuras. Sempre me ouviste. Eram os teus braços
que cobriam os meus ombros quando chorava.
Era no teu regaço que me quebrava.
E renascia. E tu permitias. Sei hoje o preço que pagaste
para me ouvir chorar. Sei hoje o que fiz ao teu coração.
Sei hoje que sempre te deixei partir.
Renasci dentro do peito. De dentro para fora.
Voltei a ser a menina que te conquistou o coração.
Sorri-me meu amor. Sorri-me estejas onde estiveres,
sorri-me. Sê feliz. Comigo ou sem mim. Voa.
Estou aqui e não tenho medo. Não tenho espaço para ter
mais algum sentimento que não o amor.
Regressa a ti mesmo. Os teus nomes, fui eu que tos dei.
Ofereci-tos. São todos teus. Quando doer eu estou aqui.
Quando não conseguires voar eu levo-te nas minhas asas.
Quando quebrares eu ergo-te. Quando estiveres cansado
eu beijo os teus dedos. E se partires levas o meu coração contigo.
Tudo o que vejo és tu.
Sorri-me.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Ciclo

A vida é uma sucessão de retrocessos,
avanços e recuos onde todas as histórias
são uma mesma história. Todos os erros,
um mesmo erro. Todos os homens,
um mesmo homem. Poeira de cinzas
do que foi um dia o meu coração.
Renasço, pura, cada dia mais autêntica.
Não me minto, não me invento, não me reinvento.
Sou apenas eu, na imensidão que leva a linha ao
ponto final. Quase me perdi de mim mesma
nos anos que antecederam a noite.
Lembras-me? O sorriso inocente, a alma
e os sonhos, os amanhãs, a ternura que oferecia
a cada alma, tão intensa, tão genuína.
A força que impelia e aos poucos o vórtice
de medo, de quebra, a angústia que apagou
os meus olhos dos meus olhos.
Lembras-me? Todas as máscaras,
o silêncio, o grito, eu que não duvidava
que podia mudar o teu mundo.
Eu que alterei a rota das tuas marés.
E um dia rendi-me. E os meus olhos
não viam. E as minhas lágrimas não eram
salgadas. E o meu coração deixou de ser
vermelho. E as minhas mãos deixaram de estar
estendidas. E eu deixei de reconhecer-me.
As palavras deixaram de curar as ranhuras
do meu destino. O rosto mudou.
Morri dentro de mim todas as noites.
Recupero, agora, as palavras.
As inocências, a ternura, as mãos abertas.
Curo-me. Acordo. Voo. Rasgo. Forço. Abarco.
Agarra-me.