quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Prefácio

Sou prefácio de mim mesma, pomba branca. Repousada na sombra do leão. Serenidade escondida, vulcão apagado. Sou prefácio de mim mesma, eternidade esguia no bater da meia noite. Curiosidade sombria, planalto de angústia e poemas. Sou prefácio de mim mesma, beijo suave da noite. Grito abafado, lábios esquivos. Tela inacabada. Sou prefácio de mesma, música lírica, luz duma estrela distante. Fruto das circunstâncias, confluência do amor. Luar que beija a linha da água do mar. Sou prefácio de mim mesma, incógnita de um destino ingrato. Chuva de Verão, Sol de Inverno. Mistério envergonhado de um sonho de menina. Sou prefácio de mim mesma. Quero ser. Epílogo de uma lágrima que escorre pelo rosto. Renasce. Quero ser. Útero de uma vida esquecida. Quero ser. Força de uma vontade daninha. Estilhaço de uma vitória muda. Sou prefácio de mim mesma. Pele de uma mulher. Alma de uma fénix. Grito de um silêncio.

domingo, 1 de setembro de 2013

"Summertime Sadness"

O momento em que descobres que os monstros te lambem os poros por baixo da pele. A linha ténue que separa a loucura da sanidade. Um rasgo de genialidade, com que enganas o desespero. Convences o vazio que existem flores e verde num tempo diferente. Sorris um sorriso quebrado perante a negação da droga com que afogam as inseguranças. Pessoas que trilham a pedra que separa a varanda do infinito. Não conhecem o fim, o início. Não compreendem o motivo que os faz acordar todas as manhãs, corrompidos dos comprimidos com que valsaram com o sono. Os olhos injectados de insónia e de mágoa. Os químicos que os atiram num sono pesado, Violador. Que apaga a memória, que não deixa espaço para sonhos desbotados. Uma população trémula, faminta de deus, de sentido. Uma população que deixou de sonhar. O momento em que descobres os monstros que te sussurram no silêncio. Te murmuram ladainhas de dias em que te curvaste sobre ti mesmo, febril, os dedos vazios. As lágrimas suspensas a aguardar o estilhaço da alma, para devastarem a pele desgastada do rosto. O momento em que olhas os monstros nos olhos. Cegos. Em que aguardas que te estilhacem. Em que esperas as garras a segurarem o teu coração, até que te vergues de dor. O momento. O momento. O momento. Interminável. Minutos que se tornam horas, que se transmutam em eternidades. Passas a língua seca pelos lábios. Vês as línguas babosas suspensas dos dentes afiados. Não desvias o olhar. Ouves os corpos que se lançam das varandas. Que riem enquanto conhecem o fechar do pano num chão duro e implacável. Ouves as mães que choram a perda de filhos. Os políticos que esfregam as mãos com a ideia de mais uma guerra absurda. Mais um fogo posto que lambe as árvores tristes. Ouves mais um dia a abraçar a noite. Os monstros afastam-se devagar. Para que saibas que por hoje venceste. Uma luta interminável de vontades. Em que não existem vencedores e vencidos. Apenas pedaços de ti pendurados nas paredes do quarto escuro.